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Digamos que você se chame Agostinho. Você é um vendedor que faz um trabalho razoável, alguns meses bate as metas e em outros não. Em alguns assuntos você é bem participativo, principalmente os que você gosta, e em outros não, quase sempre sobre aqueles assuntos que você desconhece e por isso se desinteressa logo. Você tem uma preocupação em manter seus melhores clientes, que não enchem as duas mãos, mas o máximo que você faz é tentar ser agradável no relacionamento, estar sempre dando prioridade de atendimento e quando ele lhe liga, você larga tudo e tenta resolver a situação. Um dia você poderá ser surpreendido com uma carta deste seu melhor cliente. Esta carta poderá ter um tom não muito positivo para você. Poderá lhe surpreender, pois você acha que faz o máximo por eles. Só que seu velocímetro parou há décadas e desde lá vem mantendo a mesma intensidade.  Espero sinceramente que você nunca receba esta carta. Coloque-se neste momento nesta condição. Você abre seu e-mail ou sua caixa de correspondências e encontra a carta abaixo. E agora?

 “Cidade do melhor cliente, data presente”

Prezado Vendedor Agostinho

Há mais de 20 anos que trabalhamos juntos. Lembro como era no início. Você com quase nenhuma experiência, mas muito motivado, alegre e positivo. Adorava vender. O nosso relacionamento era muito próximo. Lembra daquela pescaria no verão de 1985? Não pescamos nada, mas nos divertimos muito. Era um grupo muito legal aquele. Eu tinha 4 lojas e era considerado um grande lojista para a época. Computador nem pensar. Era coisa de indústria de porte. Internet nem existia por aqui. Mas eu tinha o fax, que já era sinônimo de modernidade extrema.

Neste tempo todo, muita coisa mudou. Agora tenho mais de 100 lojas, todas informatizadas, com controles inteligentes para manter o resultado de cada operação. Só tem uma coisa que não mudou muito, mas envelheceu apenas. Essa coisa é você meu amigo. Escrevo com dor no coração, mas talvez por não ter coragem ou habilidade para lhe dizer tudo isso de forma organizada, pessoalmente. Eu envelheci também. Foram anos difíceis. Mas agora estou me retirando da operação. Coloco pessoas de mercado para assumir de vez o meu negócio. Em uma das últimas reuniões que tivemos, onde estou passando o comando aos poucos, o atual novo responsável pelas compras fez um estudo dos fornecedores, suas propostas, considerando o quanto a equipe comercial se envolvia no meu negócio. Eles decidiram cortar alguns fornecedores. E o primeiro da lista era você e sua marca. Eu sinto muito, mas não posso fazer mais nada. Escrevo para você pois questionei muito a decisão, pelos anos de relacionamento que tivemos. Eis as razões que me passaram. Espero que entendas que isso é um gesto de valorização de nossa amizade, pois não estou escrevendo mais para ninguém. Seguem os comentários que coletei, como foram me ditos:

  1. Falta de compromisso com os resultados da loja:Vinha na loja quase sempre para largar um mostruário e buscar um pedido. Chegava até pedir pedidos para que sua cota de vendas fosse cumprida. Mas não entendia que os resultados dele deveriam ser os meus resultados. Somente desta forma teríamos uma verdadeira parceria, comprometida com o resultado na ponta do negócio. Talvez acreditasse que o seu produto não tivesse concorrentes a altura ou que pelo tempo de casa ele teria para sempre um passe conosco.
  2. Falta de conhecimentos específicos de visual merchandising, promoção digital e vendas no varejo:Não participava de nenhuma ação de loja. Somente de vez em quando contribuía com alguma coisa, mas pelo que percebemos, sempre tinha que ser algo que a fábrica que representava lhe repassava, pois se dependesse dele não fazia nada. Como expor melhor os seus produtos para vender mais? Como utilizar os materiais de PDV que nos eram enviados? Como criar campanhas em nossas redes sociais ou na loja virtual para que os seus produtos girassem mais? Nenhuma destas questões tinha resposta.
  3. Falta de habilidade para realizar treinamentos das equipes de loja:Nunca fez um treinamento em loja. Acho até que não domina um PowerPoint ou coisa do gênero, que poderia auxiliá-lo em uma apresentação. Dizia que não sabia fazer isso, que não sabia falar em público, mas sempre em nossas festividades ele estava conversando com dezenas de pessoas, bem desinibido. Mesmo se não soubesse como fazer, nunca notamos uma preocupação dele em aprender isso.
  4. Falta de foco:Até visitava as lojas e a central de compras com certa frequência considerada dentro dos limites desejáveis. Mas o foco era quase sempre em assuntos não relacionados ao negócio, buscando ser uma pessoa agradável, com piadinhas e comentários sobre política, futebol e o desempenho ruim do setor (mas sem trazer uma solução convincente).
  5. Falta de ambição:Analisando a performance dele com nossa rede, notamos que historicamente ele caiu em volume mais de 50%, mas mesmo assim nunca fez algo concreto para reverter a situação. Pode até ter reclamado um pouco, mas não é por reclamação que ganhamos dinheiro e sim vendendo nossos produtos aos consumidores. Precisamos de profissionais de vendas que queiram crescer conosco, que lutem pelo seu espaço e se esforcem em mantê-los. Muitas vezes, para fazer maiores jogos, notamos que a empresa exigia uma negociação especial e uma contrapartida do vendedor. Mas ele se recusava a participar com qualquer coisa e por alguns poucos reais por unidade se perdia um jogo de centenas de milhares de reais.

Enfim meu amigo Agostinho. Foram estes os 5 principais pontos que mais me marcaram e que não tinha uma resposta para lhe defender, pois na minha opinião eles são verdadeiros. Sei que sempre tivemos uma boa relação e nossos negócios, mesmo em volumes históricos decrescentes, sempre respeitou os lucros para ambas as partes. Mas uma nova “fornalha” de vendedores, como o Sebastian * que lhe comentei, estão tirando o espaço conquistado apenas por relacionamento, que é o seu caso.

Espero que ocasionalmente possamos nos ver e celebrar os velhos momentos e conquistas que tivemos no passado. Que você tenha melhor sorte do que esta carta que lhe escrevo.

Meu sincero pesar por este desfecho

“Seu melhor cliente”